Em Nova York, estudantes com dificuldades não conseguem vagas nas escolas mais qualificadas
The New York Times | 31/07/2011 12:00
Mary Otero não queria cometer com sua filha Aaliyah, 11, o mesmo erro que cometeu com seus dois outros filhos já crescidos. Ambos estudaram na escola Charles O. Dewey 136, no Brooklyn, em Nova York, e dali para frente tudo foi por água abaixo.
“Muitas crianças na Dewey matam aulas e ficam nas ruas”, disse Otero. “As crianças são agredidas no parque”.
Ela temia que matricular sua filha em uma escola do ensino fundamental de baixo desempenho, como a Dewey, iria relegar Aaliyah a uma escola do ensino médio de baixo desempenho e com disso, como no caso de seus outros filhos, ela abandonaria a escola de vez.
Então, no ano passado, quando Aaliyah começou a quinta série na Escola Pública 24, Otero, uma artista gráfica freelancer e mãe solteira, praticamente memorizou o manual de escolas do ensino fundamental do Departamento de Educação. Ela participou da feira da escola de ensino médio do seu distrito e visitou escolas consideradas as melhores da região.
Os pais devem informar suas escolhas para o sorteio do distrito, mas o manual é vago sobre as exigências de cada escola. Todas as escolas listam os “critérios de seleção” dizendo a mesma coisa: “revisão de notas e resultados de provas”.
São os orientadores profissionais que dizem aos pais como as coisas realmente funcionam. Aaliyah chegou perto das notas exigidas nos testes.
Otero visitou a Escola do Ensino Fundamental 51, uma das escolas mais cobiçadas da região. “Eu vi como eles aprendem”, lembrou. “Todos os alunos estavam sentados e prestando atenção no professor.”
Ela também visitou a New Voices Escola de Artes Acadêmicas e Criativas, que requer uma audição. Aaliyah nunca teve aulas de música, mas a família tem um violão. “Estou apenas aprendendo”, disse Aaliyah. “Eu assisto a um canal de tevê com violões e vejo onde colocar os dedos”. Perguntada sobre como foi sua audição, ela disse: “Um pouco confusa”.
A primeira escolha de Otero para Aaliyah foi a Escola do Ensino Fundamental 51, em seguida, a New Voices, e ela listou a Dewey como última opção.
Em meados de maio, as cartas de aceitação chegaram.
“Dewey”, disse Otero. “Um completo desperdício do meu tempo. Ela poderia ter ido direto para a Dewey”.
Otero entrou com um recurso.
Muito antes do governo Bloomberg, os distritos ofereciam a escolha da escola. Mas nos últimos anos o processo se tornou mais complicado. O movimento de reforma criou um mercado educacional no qual as escolas competem por alunos. Isso é bom para os alunos selecionados para as escolas mais fortes, mas não tão bom para as crianças deixadas para trás e agrupados nas instituições mais fracas.
Entre 80% e 90% dos alunos entram em uma de suas três primeiras escolhas, de acordo com um porta-voz do Departamento de Educação. Mas os alunos com notas mais altas são mais procurados e têm melhores chances.
Christina Fuentes, diretora da Escola Pública 24, teme que as crianças estão sendo segregadas de acordo com suas notas, com os alunos que tiram as mais altas indo para um conjunto de escolas, e aqueles com as mais baixas para as que sobram.
Os 110 alunos de quinta série da Escola Pública 24 são em sua maioria pobres com necessidades especiais (92% qualificam para o almoço grátis, para 46% o inglês é uma segunda língua, 19% estão no ensino especial, de acordo com estatísticas mais recentes no site do Departamento de Educação). Eles foram aceitos em nove escolas de ensino médio para início no outono. O maior grupo, de 36 alunos, irá para a Dewey.
Cinco irão para a Escola do Ensino Fundamental 51.
Na Dewey, 90% dos alunos recebem merenda subsidiada, para 39% o inglês é uma segunda língua e 21% estão em educação especial.
As salas de artes da linguagem tem tamanho médio de 40 alunos.
Na Escola do Ensino Fundamental 51, 39% recebem almoços subsidiados, para 2% o inglês é uma segunda língua e 10% estão em educação especial.
As salas de artes da linguagem tem tamanho médio de 29 alunos.
Academicamente, a maioria das crianças com notas 3 e 4 na escola primária continuam a obter notas 3 e 4 na Escola do Ensino Fundamental 51, enquanto alunos com notas 1 e 2 continuam a obter notar 1 e 2 na Dewey.
Na Dewey, 12% são proficientes em artes da linguagem com uma pontuação média de 2,3 nas provas do Estado; 20% são proficientes em matemática com uma pontuação média de 2,4.
Na Escola do Ensino Fundamental 51, 82% são proficientes em artes da linguagem com uma pontuação de 3,34; 83% são proficientes em matemática com uma pontuação de 3.8.
Dennis Walcott, o chanceler das escolas, disse em um email: “Nosso objetivo é garantir que cada família, independentemente das opções citadas em sua inscrição, tenha seus filhos colocados em escolas que facilitem sua chegada a uma faculdade. Estou ansioso para envolver toda a comunidade e oferecer opções de qualidade para todos os alunos do ensino médio”.
Talvez algum dia, mas ainda não e isso desanima Fuentes, uma diretora que dedicou sua vida profissional para trabalhar com crianças pobres. Em 2010, ela foi uma das seis nova-iorquinas a ganhar o Prêmio Sloan de Serviço Público. “Precisamos de uma política melhor”, disse ela, “para que as crianças possam ser mais bem integradas.”
“Como esse pode ser o caminho certo quando tudo é tão desigual?”, disse.
Gloria Jaramillo, orientadora da Escola Pública 24, gostaria que os manuais fossem mais transparentes e indicassem as escolas que recebem principalmente alunos com notas 3 e 4. O processo de seleção é controlado pelos distritos e eles não especificam as pontuações. “É muito confuso para os nossos pais”, disse ela.
Como os resultados das provas da quinta série não estão disponíveis quando os alunos escolhem uma escola de ensino médio, as notas da quarta série são usadas na seleção. “Essas notas são de quando os alunos são muito jovens e isso pode afetar a sua vida até o fim do ensino médio”, disse Jaramillo.
Ela estima que 25 dos alunos da Escola Pública 24 a caminho de escolas de ensino médio de baixo desempenho se sairiam bem em escolas mais fortes.
Mariela Torres é uma estudante que Jaramillo acredita que iria prosperar em uma escola mais exigente. “Apesar das dificuldades de aprendizagem, ela é capaz de superá-las”, disse Jaramillo. “Ela é uma criança comprometida em ser bem sucedida”.
O pai de Mariela, Albino Torres, indicou a Escola de Matemática e Ciência Exploratória, uma das mais seletivas do bairro, como a primeira escolha da família. Dois alunos da Escola Pública 24 foram aceitos nela em quatro anos.
Mariela não foi, e Torres apelou.
“Pode ser uma falsa esperança”, disse Tamara Estrella, coordenadora de pais da Escola Pública 24. “Quase ninguém ganha uma apelação”.
Mariela não ganhou, e nem Aaliyah. Em setembro as duas meninas serão colegas na Dewey.
* Por Michael Winerip
Fonte: Último Segundo – http://ultimosegundo.ig.com.br/educacao/selecao+de+melhores+em+escolas+deixa+alunos+para+tras/n1597108071443.html
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